Advogada explica os limites legais e o que caracteriza desvio que gera passivo trabalhista

O estágio é uma das principais portas de entrada para o mercado de trabalho, mas nem sempre é conduzido de forma legal. Em muitos casos, o que deveria ser uma experiência formativa se transforma em um vínculo empregatício disfarçado, gerando risco de ações judiciais, condenações e danos à reputação de empresas.

De acordo com levantamento da Associação Brasileira de Estágios (Abres), o Brasil tem cerca de 1 milhão de estagiários ativos e boa parte desconhece seus próprios direitos. Um estudo recente revelou que cerca de 1 em cada 5 estagiários não enxerga nenhuma relação entre as atividades exercidas e sua formação acadêmica, o que demonstra uma desconexão entre o propósito do estágio e a prática real.

A advogada Nádia Côrtes, do escritório Andrade e Côrtes, alerta que o desvirtuamento da relação de estágio é mais comum do que se imagina, especialmente entre estudantes que assumem rotinas semelhantes às de empregados contratados. “O estágio precisa ter finalidade educativa, com supervisão adequada e atividades compatíveis com o curso do estudante. Quando isso não acontece, a empresa pode ser responsabilizada e obrigada a reconhecer o vínculo empregatício, pagando todos os direitos retroativos”, explica. “Se o estudante estiver apenas executando tarefas operacionais, sem aprender, sem supervisão e sem conexão com sua formação, isso precisa ser revisto. Estágio não é mão de obra barata, é uma oportunidade de formação supervisionada”, afirma a advogada.

A Lei nº 11.788/2008, conhecida como Lei do Estágio, estabelece regras claras para diferenciar o estágio do emprego formal. Para que o estágio seja considerado regular, é necessário que ele cumpra uma série de exigências formais e materiais. Entre as exigências formais estão o vínculo do estudante com uma instituição de ensino, a assinatura de um termo de compromisso entre as partes, a existência de um plano de atividades, seguro contra acidentes pessoais e supervisão técnica. Já as exigências materiais dizem respeito à compatibilidade das atividades com o curso do estudante e com o objetivo educacional do estágio, além da proibição de substituir mão de obra efetiva da empresa.

Quando essas exigências são ignoradas, por exemplo, se o estagiário assume carga horária superior ao permitido, trabalha sem orientação pedagógica ou realiza funções que não têm relação com sua área de estudo, a Justiça do Trabalho pode reconhecer vínculo empregatício, com direito a FGTS, férias, 13º salário, horas extras, entre outros encargos. “Muitos estudantes acabam atuando como verdadeiros empregados, mas com remuneração inferior e sem os direitos garantidos por lei. É aí que a relação se torna irregular e a empresa assume um passivo trabalhista”, reforça Nádia.

Para empresas, prevenção é o melhor caminho

Para evitar prejuízos e garantir uma atuação legal, empresas devem seguir rigorosamente a legislação, manter a documentação em dia e investir em supervisão técnica de qualidade. Além disso, é importante revisar os contratos periodicamente, com apoio jurídico, para garantir que as atividades estejam alinhadas ao curso do estudante. “A prevenção ainda é a melhor estratégia. Estágio bem estruturado traz benefícios para todos os envolvidos. Mas, quando a empresa usa o contrato como escudo para uma relação de trabalho disfarçada, o risco é alto, tanto juridicamente quanto para a imagem institucional”, finaliza a advogada.

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